Introdução
A educação nunca foi neutra. Cada conteúdo, cada currículo, cada disciplina carrega consigo uma visão de mundo, uma cosmovisão que forma a maneira como uma criança entenderá Deus, o mundo e a si mesma. Por isso, a pergunta fundamental que define qualquer civilização é: quem tem o direito — e o dever — de educar as crianças?
Para muitos no Brasil, a resposta parece simples: o Estado. Mas uma análise cuidadosa das Escrituras, da história e das consequências sociais dessa transferência de responsabilidade revela que essa mentalidade é moderna, ideológica e anticristã.
Este artigo é uma defesa bíblica e histórica do princípio reformado de que a educação dos filhos pertence aos pais, não ao Estado. Usaremos como base Deuteronômio 6, refletiremos sobre a imposição da educação compulsória nos Estados Unidos do século XIX e a resistência armada de famílias cristãs que sabiam que seus filhos não pertenciam ao governo.
A educação em Deuteronômio 6: responsabilidade pactual dos pais
A Bíblia não apenas dá orientações sobre educação — ela estabelece quem deve educar. Em Deuteronômio 6.6–7, o Senhor diz:
“Estas palavras que hoje te ordeno estarão no teu coração; tu as inculcarás a teus filhos, e delas falarás assentado em tua casa, e andando pelo caminho, e ao deitar-te, e ao levantar-te.”
Observe que Deus não delega a função de educar aos sacerdotes nem ao Estado. A instrução moral, espiritual e prática é confiada aos pais, que devem transmitir a Lei de Deus de forma constante, viva e integrada ao cotidiano.
No pensamento reformado, especialmente entre os puritanos e nos círculos pós-milenistas, essa responsabilidade é considerada pactual: uma obrigação solene entre Deus e as famílias da aliança. Transferir essa missão ao Estado é, nesse contexto, uma ruptura com o pacto divino.
O surgimento da educação estatal e compulsória
Por séculos, a educação foi uma atividade familiar e eclesiástica. Pais ensinavam seus filhos a ler para que compreendessem a Bíblia, enquanto igrejas mantinham escolas de instrução religiosa. Foi assim durante a Reforma Protestante, com Lutero e Calvino incentivando a alfabetização para o estudo das Escrituras.
Tudo mudou no século XIX, especialmente nos Estados Unidos, onde a crescente influência do iluminismo e das filosofias seculares levou ao estabelecimento de um sistema educacional público, laico e compulsório.
Em Massachusetts, 1852, o Estado aprovou a primeira lei de escolarização obrigatória, exigindo que todas as crianças frequentassem escolas aprovadas pelo governo. Em teoria, a medida buscava combater o analfabetismo; na prática, foi um instrumento de padronização cultural, ideológica e religiosa.
A resistência armada dos pais cristãos
O que poucos sabem é que muitas famílias resistiram ativamente a essa imposição estatal. Em comunidades como a de Barnstable, Massachusetts, pais se recusaram a enviar seus filhos às escolas públicas, alegando que o conteúdo e a autoridade estatal violavam sua fé cristã e sua responsabilidade diante de Deus.
Alguns relatos históricos registram que milícias locais foram enviadas para forçar a matrícula, e que pais se barricaram com armas, dispostos a lutar pela prerrogativa de educar seus filhos em casa ou em escolas confessionais.
Embora a maioria dessas resistências tenha sido sufocada, elas deixaram claro que havia uma compreensão — hoje quase perdida — de que o ensino dos filhos é um direito inalienável dos pais. E mais: um dever dado por Deus, que nenhuma autoridade civil pode anular.
A guerra moderna pela mente: o currículo como campo de batalha
Hoje, os pais cristãos continuam a enfrentar uma realidade hostil. Em muitos países — incluindo o Brasil —, o ensino público é ideologizado, hostil à fé cristã e contrário à moral bíblica. Conceitos como:
- Relativismo moral
- Ideologia de gênero
- Teorias pós-modernas
- Revisionismo histórico anticristão
…são introduzidos desde as séries iniciais, muitas vezes sem o consentimento dos pais.
Além disso, em várias instâncias jurídicas e legislativas, o Estado tenta se colocar como tutor da criança, ignorando os princípios do poder familiar, estabelecidos tanto pela Bíblia quanto pelas tradições jurídicas ocidentais.
Essa tendência é tão profunda que, em muitos lugares, pais são criminalizados por optar pelo homeschooling — a prática de educar os filhos em casa, como fizeram os puritanos, os reformados holandeses e os pioneiros americanos.
A resposta cristã: reconquistar a educação
O caminho reformado não é o da fuga nem o da mera reclamação. É preciso reconstruir uma visão bíblica, teológica e cultural da educação. Isso passa por:
- Assumir a responsabilidade total pela educação dos filhos — curricular, moral e espiritual.
- Investir em escolas confessionais e redes de apoio ao homeschooling.
- Resistir legal e politicamente às imposições estatais abusivas.
- Educar os filhos com base na cosmovisão cristã, ensinando-lhes que o Senhor é soberano sobre todas as áreas da vida.
- Denunciar a falsa neutralidade do ensino estatal, que apresenta um humanismo secular como se fosse verdade científica.
A cosmovisão reformada nos ensina que Cristo reina também sobre a educação. Não há área neutra. Cada disciplina deve ser moldada pela Palavra de Deus: a história deve reconhecer a providência divina; a biologia, o Criador; a matemática, a ordem do universo que reflete o caráter de Deus.
Conclusão: a mente das crianças pertence a Cristo
Os filhos não pertencem ao Estado. Eles são herança do Senhor (Salmo 127.3) e foram confiados aos pais para serem discipulados na aliança. Transferir essa responsabilidade ao governo — especialmente a governos hostis ao evangelho — é uma quebra de mandato divino.
A história mostra que a liberdade religiosa começa na liberdade educacional. E onde os pais perdem o direito de ensinar seus filhos segundo sua fé, ali a tirania cultural está à porta.
Como disse R. J. Rushdoony, teólogo reconstrucionista:
“Educação é sempre uma função da religião. Quem controla a educação, molda a alma da próxima geração.”
É hora de os cristãos brasileiros redescobrirem sua vocação como educadores primários de seus filhos, e resistirem — com sabedoria, coragem e fé — a qualquer sistema que usurpe esse papel.